Imagem capa - Carta para meu Pai por Jocieldes Alves
FOTO QUE FAZ SENTIDO

Carta para meu Pai

A convite do meu grande amigo Thiago Lima, fizemos o casamento de Malba e Alexandre. Um casal de um amor verdadeiro pela arte e pela fotografia.

Acho que nem preciso escrever muito sobre a história dessa imagem. Só tenho a dizer que a técnica não serve de nada se não tiver um propósito!






Carta para meu pai


          Ele queria um menino... No lugar, vim eu! Ganhei carrinho de brinquedo e caminhão de madeira. Ele queria um menino por pensar que assim teria uma companhia pra vida toda. E eu nunca o deixei só...


Meu pai era Sargento da Polícia Militar da Paraíba, homem forte, apaixonado pelo que fazia. Ele adorava a rotina do quartel e, quando eu era criança, a brincadeira dele conosco era nos colocar em fila para marchar. Brincávamos de quartel, ele era o Sargento (claro!) e minha irmã, eu e as amigas da rua éramos os “soldados”. A minha relação com ele era de verdadeiro apego, eu o idolatrava. Quando ele saía para trabalhar a saudade batia, eu pegava alguma roupa dele e dormia cheirando. Ah, o cheiro dele... Quando em casa, eu não dava sossego, ficava o tempo todo perto, de quase tudo que ele comia eu certamente pedia um pedaço, para onde ele ia eu queria ir também. Terminei eu sendo a companhia dele...


          Com o passar do tempo, muita coisa mudou, veio a separação, a saída de casa, a saudade só curada em alguns finais de semana, os desentendimentos também, como todo pai e filha. Mas ainda assim, nada nos separou completamente. Sempre senti que tinha uma relação especial com ele, algo só nosso. Logo eu, que sou a cara dele.Nossos momentos juntos eram únicos, altas gargalhadas e piadas, conversas sérias,conselhos dele, conselhos meus, nos tornamos também dois bons amigos. Quando ele adoeceu, dei amor e cuidado, tratei, dei banho, fiz barba, cortei as unhas, tudo com todo amor que podia dar. E era muito amor... Ouvi o perdão pelos erros do passado,ouvi-o dizer que eu o havia surpreendido, que não esperava que a caçula um dia tão frágil, cuidaria dele, o forte Sargento, no futuro. O tempo passou e ele sarou, voltou a ser o homem de sempre e eu apenas filha de novo.


             Infelizmente as coisas não são como esperamos, e quando achei que o tinha, avida tirou meu Sargento de mim. Nada pude fazer... Tantos planos eu tinha. Dancei a valsa da formatura sem ele apenas três meses depois. Meu mundo caiu. Meu pai se foi. Nada mais de encontros regados a comida e gargalhadas, nada mais de ligações e conversas de duas horas no celular, nenhum “eu te amo” eu ouviria mais. Agora eu chorava a dor da saudade, da falta, do lugar impossível de ser substituído que agora estava vazio.


             Meu pai tem lugar especial na minha vida, em quem sou. Ele faz parte de mimem cada gesto parecido, em cada espirro que dou igual ao dele, em cada olhar no espelho em que vejo os olhos dele nos meus. A verdade é que meu Sargento está comigo sempre, ele nunca me deixou de verdade, por que ele vive em mim.


           Três anos se passaram após a sua partida, minha vida mudou, resolvi que havia chegado a hora de casar, de viver com aquele que escolhi para amar. Resolvi que casaria na igreja e que nela entraria com meu pai. Com meu pai em gesto, com meu pai em mim, com meu pai em símbolo. O símbolo da profissão que ele amou, que serviu com amor por trinta anos, que era conhecido e admirado. Eu entraria na igreja com meu Sargento vestido como tal, fardado. Sorte minha então encontrar a fivela do cinto dele que parecia estar lá, guardada, ainda com o cheiro dele, me esperando,apenas aguardando o momento para se juntar ao meu pai de novo no lugar onde hoje ele habita soberano, meu coração.



Ao seu comando SEMPRE Sargento, Sargento Duarte.


“Ordinário, marche”! “Direita volver”! “Sentido”! “DESCANSAR”...


Com amor, sua Binha...


Malba Duarte



Foi fotografado por nós e quer ter sua história contada aqui? Basta enviar para jocieldes_@hotmail.com a foto que fizemos junto com o texto escrito por você!


Gostou? Compartilhe com seus amigos!